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Dia da Mulher Negra – desafios e motivações de pesquisadoras negras na UFV

Dra. Ivonete da Silva Lopes – professora DER

O dia 25 de julho foi a data escolhida para dar visibilidade à luta das mulheres negras contra a opressão de gênero, a exploração e o racismo, instituído em 1992 após a realização do 1º Encontro de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenhas na República Dominicana com o objetivo de. No Brasil o dia foi instituído apenas em 2014 por meio da Lei nº  12.987/2014. Para a professora e pesquisadora Ivonete da Silva Lopes do Departamento de Economia Rural da UFV, as datas são importantes para pautar o debate público, mas não devem se concentrar apenas nelas. “A data acaba sendo importante por pautar o debate público na sociedade, por dar visibilidade às pesquisas que são feitas sobre o tema, principalmente pesquisas feitas por pesquisadoras e pesquisadores negros em sua maioria e também por divulgar dados oficiais, do IBGE, do IPEA, que falam sobre desigualdade. Esses dados mostram a materialidade do racismo.”, aponta a pesquisadora.

E as pesquisas que tenham como objeto a mulher negra, ou que tratem indiretamente do tema, têm aumentado graças também às políticas afirmativas e inserção de mais estudantes negros nos cursos de graduação e pós-graduação, como destaca a professora. “A agenda de pesquisa envolvendo a população negra, população quilombola e as mulheres negras começa a aumentar e ganhar maior visibilidade quando as universidades começam a ser mais plurais. Uma política de quotas de acesso para jovens negros em todos os cursos, porque você só vai ter doutores em determinadas áreas de conhecimento se você tem alunos graduados nessas áreas.  A partir do momento em que chegam mais professores na universidade que são negros e negras e que chegam mais alunos, há um aumento de pesquisas pra discutir relações raciais e de gênero, tanto na universidade quanto na sociedade brasileira”, ressalta Ivonete. A pesquisadora teve como tema de pós-doutorado a luta contra o racismo em sites sobre relações raciais, desenvolvido na universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos. Seu mais recente trabalho aborda as mulheres quilombolas e a comunicação durante o enfrentamento da pandemia de Covid-19.

Dra. Maria Alice Mendonça – professora do DER

Outro exemplo de como a representatividade afeta a formação de mais pesquisadores é da também professora do departamento de Economia Rural da UFV Maria Alice Mendonça. Formada em Agronomia e doutora em Desenvolvimento Rural, ela conta que não teve praticamente referências de mulheres negras em sua trajetória acadêmica. “Eu nunca tive uma professora negra, o mais próximo disso foi uma orientadora com uma ascendência miscigenada. A maioria dos professores que eu tive foram mulheres brancas ou homens brancos e isso tem muito impacto na formação de uma mulher enquanto pesquisadora. E como eu vejo esse impacto? Como que isso marca a minha trajetória e como isso hoje vem refletir na forma que eu me torno essa pesquisadora e essa descoberta de ser uma mulher negra, pesquisadora, professora.”. Hoje, há 4 anos lecionando na UFV disciplinas para os cursos da área das ciências agrárias, ela vê essa realidade começar a mudar, pouco a pouco. “Eu vejo muito os alunos reconhecerem isso em mim, uma mulher jovem, negra, dando aula na agronomia. Certamente se não sou a única, sou uma das únicas. E isso tem muito impacto para outras mulheres que fazem agronomia, que são negras. Têm impacto para os homens que são negros”, acrescenta.

Suéllen Lourenço – mestre em Estudos Linguísticos

A motivação pelo estudo das questões raciais nas pesquisas científicas também têm partido dos próprios alunos, que propõem estudos que envolvam o tema, como a ex-estudante de mestrado do Programa de Pós Graduação em Letras da UFV, Suéllen Lourenço, que defendeu em março a dissertação “Representação de pessoas negras na publicidade: uma análise discursiva da campanha #AvonTáOn”. A motivação da bacharela em Secretariado Executivo Trilíngue veio da inquietação sobre a representação da mulher negra nas personagens de telenovelas que acompanhava desde mais nova. Suellen conta que não se sentia identificava também em revistas, campanhas publicitárias e começou a questionar os papéis que era atribuídos à mulher negra. “Enquanto mulher negra eu sempre procurei enxergar como eu era vista”, explica.

A dissertação da Suellen, orientada pela professora do departamento de Comunicação Mariana Procópio e também integrante de grupos de pesquisa que tratam sobre a diversidade (DIZ – Grupo de Pesquisa em Discursos e Estéticas da Diferença) e as questões de gênero (NIEG – Núcleo Interdisciplinar de Estudos de Gênero), abordou as representações concernentes às pessoas negras em uma campanha publicitária de uma empresa de cosméticos do ano de 2021.  Suéllen concluiu que, apesar da tentativa de quebrar certos padrões, a campanha ainda traz alguns traços estereotipados da representação da mulher negra. “A dança retratada na peça publicitária, por exemplo, é tida como uma habilidade nata da mulher negra, o que acaba tirando da pessoa negra as habilidades intelectuais, é como se estivesse limitado às habilidades corporais”, exemplifica a autora.

Maria Fernanda Ruas – estudante de graduação em Jornalismo

            Também com foco na mulher negra, a estudante de jornalismo Maria Fernanda Ruas desenvolve o projeto de iniciação científica Mães negras e trabalho doméstico: análise discursiva de produtos jornalísticos sobre o “Caso Miguel”. O trabalho tem a proposta de discutir como as narrativas estabelecidas no ambiente midiático da TV aberta podem legitimar/deslegitimar e promover violências contra mulheres negras na contemporaneidade brasileira e como os fatos narrados excluíram o debate do campo das violências raciais herdadas nas relações entre empregadas domésticas e chefes brancos/brancas. Maria Fernanda já havia participado anteriormente de dois projetos cujo foco do estudo é o racismo estrutural, também vinculado ao grupo de pesquisa integrante do IPPDS DIZ.

            Na UFV ainda há espaço para mais estudos nesta temática, contudo, a professora e pesquisadora Ivonete Lopes lembra que para que esse número cresça, é preciso disponibilizar recursos para as pesquisas: “Há uma agenda mas infelizmente a gente não faz pesquisa sem dinheiro, então a gente também tem que sensibilizar que as agências de fomento criem linhas de pesquisa que sejam específica pra essa área. É preciso ter linhas de políticas afirmativas para determinadas áreas de pesquisa porque senão você entra na universidade e não consegue fazer pesquisa, não consegue ter um grupo porque não tem financiamento.”

Confira os trabalhos recentes que abordam o tema da mulher negra nos grupos e linhas de pesquisa que fazem parte do IPPDS.

Mulheres Quilombolas e ausência de comunicação intercultural para o enfrentamento da Covid-19. Autoras: Ivonete da Silva Lopes, Daniela de Ulysséa Leal, Jéssica Suzana M. Cardoso e Carina Aparecida Veridiano.

Desigualdades raciais e de gênero no mercado de trabalho durante a pandemia de COVID-19: uma análise para o Brasil (14/01/2022). Autor: Mateus Rodrigues Gonçalves Tavares. Orientadora: Lorena Vieira Costa Lelis. Coorientadora: Ana Cecília de Almeida. Banca: Lorena Vieira Costa Lelis, Maria Micheliana da Costa Silva e Cícero Augusto Silveira Braga. 

Mães negras e trabalho doméstico: análise discursiva de produtos jornalísticos sobre o “Caso Miguel”. Autora: Maria Fernanda de Oliveira Ruas. Orientadora: Mariana Ramalho Procópio.

Representação de pessoas negras na publicidade: uma análise discursiva da campanha #AvonTáOn. Autora: Suéllen Stéfani Felício Lourenço.

Os resumos de cada trabalho estão disponíveis na segunda parte da reportagem.

Texto: Thiara Klein – assessora de comunicação IPPDS-UFV (MTB 14.134MG)

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